Luiz Fernando de Melo Corrêa
Uniforme de um prisioneiro TJ de um campo de concentração nazista. Foto: Lili Galligani.
Desde
quando surgiu um pequeno grupo de estudantes da Bíblia na Pensilvânia, Estados
Unidos, coordenados por Charles Taze Russel, na segunda metade do século XIX, que
as Testemunhas de Jeová (TJ) buscam entender, resgatar, praticar e divulgar o Cristianismo
original apresentado nas páginas da
Bíblia. Mesmo sem se pretenderem infalíveis ou portadores de uma nova
revelação, as Testemunhas de Jeová tentam viver o Cristianismo na sua essência,
mesmo que, para isso, sejam vítimas de más interpretações, preconceitos e até mesmo
de severas perseguições.
Na
Europa das décadas de 1920 e 1930, as TJ já estavam presentes em vários países
divulgando a Bíblia em dezenas de idiomas. Mesmo com as grandes agitações
políticas efetuadas por fascistas, comunistas, liberais e anarquistas, as Testemunhas
continuaram neutras na política, sua preocupação básica era divulgar somente o
Reino de Deus. Entendiam que os governos e os projetos humanos não trariam
solução definitiva aos problemas da humanidade.
Com
a ascensão do Nazismo ao poder na Alemanha a partir de 1933, a mensagem do
Reino de Deus, a neutralidade em assuntos políticos e a não participação nos esforços
de guerra colocaram as TJ como um dos maiores inimigos de governo nazista e do
seu líder, Adolf Hitler.
Por
não apoiar o militarismo, o racismo e a idolatria ao ditador, Hitler, já em
1934, em toda a Alemanha, as TJ passaram a ser espancadas, humilhadas e
expulsas das escolas e dos empregos, além de perderem suas casas, direitos
trabalhistas e a cidadania alemã.
Helmut
Krausnick e Martin Broszat, em seu livro Anatomia
do Estado das SS, declararam: “Uma categoria adicional de presos sob
detenção (...) depois de 1935 (...) em campos de concentração (...), provinha
dos membros das Testemunhas de Jeová”. Em alguns campos de concentração as TJ
chegavam a representar cerca de 10% dos prisioneiros e em muitas delas foram
confinadas antes mesmo que os judeus. Os autores também comentaram: “Em 1939, a
maioria dos detentos [ do campo de concentração ] de Sachsenhausen, era de elementos anti
sociais, homossexuais, Testemunhas de Jeová e criminosos habituais”.
A
historiadora inglesa Christine King relatou: “surpreendentemente para os
nazistas, as Testemunhas tampouco puderam ser eliminadas. Quanto mais
fortemente eram pressionadas, tanto mais compactas ficavam, tornando-se duras
como o diamante, em sua resistência. Hitler as lançou numa batalha
escatológica, e elas mantiveram a fé. Com seu triângulo roxo (identificação no
uniforme de prisioneiro), formaram fortes redes [de resistência] nos campos; sua experiência
constitui valioso material para todos que estudam a sobrevivência sob extremo
stress”.
Por
que as TJ foram tão perseguidas mesmo sendo um pequeno grupo de apenas 20 mil
pessoas, numa Alemanha que possuía milhões de habitantes? Por que um grupo
aparentemente inexpressivo causou tanta pressão por um regime supostamente
consensual em toda a nação alemã?
As
razões são várias, mas três delas se destacam.
Primeiro,
as Testemunhas de Jeová se recusaram a fazer a saudação Heil Hitler. Isto porque elas atribuem a sua salvação a Deus e
dedicaram a sua vida somente a Ele. Tal crença baseia-se no Salmo 83:18 que
afirma: “Somente tu [Jeová] és o Altíssimo sobre a Terra”. Fazer o gesto com a
mão e gritar “Heil Hitler” implicava dizer que a salvação viria por meio de
Hitler, não por meio de Jeová [Deus] e de Jesus.
Segundo,
as Testemunhas entendem que, embora os governos humanos mereçam respeito e
honra como autoridades constituídas, elas obedecem a Deus antes que aos homens,
segundo o ensino da Bíblia em Atos 5:29,40-42. Quando os governos ordenam às TJ
a desrespeitar os princípios da Bíblia elas prontamente se recusam, mesmo que isso
implique na perda do emprego, da liberdade e mesmo da vida.O Estado nazista
ordenou as TJ a pegar em armas, aderir ao Partido Nazista e idolatrar a pessoa
de Hitler e elas corajosamente recusaram, preferindo continuarem íntegras a
Deus.
Terceiro,
mesmo com a decretação da pena de morte pelo Estado nazista a todo aquele que
se recusassem acatar certas ordens (tanto a morte lenta nos horrores diários das
prisões como na morte imediata por fuzilamento
ou gás venenoso nas câmeras mortíferas dos campos de concentração) as Testemunhas, mantiveram-se firmes, pois têm
inabalável confiança na capacidade de Deus de devolver-lhes a vida por meio da
ressurreição, segundo o livro bíblico de
João 5:28,29.
De
1919 a 1933, as TJ distribuíram em média oito livros, folhetos e revistas a
cada uma das cercas de 15 milhões de famílias na Alemanha.
A
revista A
Idade de Ouro,
depois Consolação, muitas vezes chamou
a atenção ao ressurgimento do forte militarismo na Alemanha. Em 1929, mais de
três anos antes de Hitler chegar ao poder, a edição em alemão de A Idade de
Ouro
(atual Despertai) destemidamente
declarou: “O Nacional-Socialismo é um movimento diretamente a serviço do
inimigo do homem, o Diabo”. A Sentinela de 1º de novembro de 1933 (em inglês) trazia
o artigo “Não os temais”. Foi escrito especialmente para as TJ alemãs,
exortando-as a terem coragem em fase de crescente pressão.
Em
09 de fevereiro de 1934, J.F. Rutherford, presidente da Sociedade Torre de
Vigia (entidade jurídica que representa as TJ) enviou uma carta de protesto a
Hitler exigindo que o governo alemão desse liberdade às TJ para reunir-se pacificamente para a adorar a Deus sem barreiras.
Rutherford deu o prazo até 24 de março de 1934 para Hitler atender esse pedido;
se não houvesse resposta favorável, as TJ divulgariam os fatos sobre a
perseguiçãoem toda a Alemanha.
Por
não haver qualquer resposta positiva em 7 de outubro de 1934 as TJ de cinquenta países enviaram um
telegrama para Hitler dizendo em outras coisas “Refreie-se de continuar
perseguindo as TJ ; de outra forma, Deus o destruirá, bem como a seu partido
nacional”. Os nazistas ficaram furiosos e enviaram muitas TJ para os campos de
concentração. Hitler chegou a dizer que “exterminaria essa raça (as TJ) da Alemanha”.
A partir dali as TJ passaram a expor as atrocidades nazistas, não somente na
Alemanha, mas em toda a Terra.
TJ presas em um campo de concentração nazista. Foto: Domínio Público
Em
1935, A Idade de Ouro expôs os
métodos de tortura inquisitoriais do regime nazista e o seu implacável sistema
de espionagem, perseguição e aprisionamento. Em dezembro de 1936, promoveram
uma campanha de distribuição rápida e subterrânea de uma resolução de protesto
contra a perseguição às TJ. Em 20 de junho de 1937, as TJ que ainda não tinham
sido presas distribuíram uma mensagem dando nomes das autoridades, datas e
lugares que praticavam perseguições. A Gestapo (polícia secreta do regime
nazista) ficou estarrecida com essa exposição e pela capacidade organizativa
das TJ em realizá-la.
Outras
publicações de alerta contra o regime Nacional-Socialista entre 1937 e 1938 foram
as seguintes: Encare os Fatos, que acusava
os regimes totalitários como pretensos substitutos do Reino de Deus; Aviso! Que alertava que os fascistas e
nazistas acabariam com toda a liberdade humana e revitalizariam a antiga
Inquisição; Fascismo ou Liberdade. Defendia
que a subida do Nazismo ao poder era obra do Diabo, sendo Hitler um homem
demente, cruel, maligno e implacável. Consolação
(revista, várias edições) Denunciava que haviam sinistras experiências com gás venenoso, para assassinar
prisioneiros no campo de concentração de Dachau. Além de existirem mais de
vinte campos onde as condições eram indescritivelmente desumanas, que grupos
inteiros de judeus, ciganos, poloneses, gregos, sérvios e outros, estavam sendo
exterminados sistematicamente; Cruzada
contra o Cristianismo, documentava, em pormenores, os perversos campos de
concentração, incluindo desenhos detalhados dos campos de Sachsenhausen e
Esterwegen.
Semelhante aos primeiros cristãos que, pela
fé e amor a Deus e a Cristo, sobreviveram à opressão e às mortes nas arenas
romanas. As TJ, que se esforçam em imitar os primeiros cristãos nos tempos
modernos, também foram vitimas de regimes opressivos e cruéis que tentaram (e
ainda tentam ) quebrar a integridade
delas a Deus. Assim como os opressores romanos do passado perderam a batalha contra
os cristãos que se mantiveram firmes e íntegros mesmo na morte.
O
regime Nacional Socialista também perdeu sua batalha contra as TJ, pois seu
governo e partido totalitários foram destruídos após a SGM e seu “deus” Hitler suicidou-se
e depois foi queimado na própria capital do império nazista, Berlim. Em 1946,
após a guerra, as TJ da Alemanha realizaram um grande congresso em Nuremberg no
mesmo estádio onde Hitler proferia seus discursos e exibia suas espetaculares
demonstrações de poder.
No
mesmo dia em que foram anunciadas as sentenças por crimes de guerras dos
comandantes nazistas. Na ocasião disse o presidente do congresso: “Só o fato de
poder presenciar este dia, que é apenas um antegosto do triunfo do povo de Deus
sobre seus inimigos na batalha do Armagedom, valeu a pena eu ter passado nove
anos nos campos de concentração”.
Que fatos como os relatados acima,
sejam lembrados sempre por toda a humanidade, para que crueldades tamanhas sofram
o repúdio das atuais e futuras gerações.
Bem aventurados os
pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus. (Matheus 5: 9)
Placa memorial as TJ que sofreram o terror no Campo de Concentração de Mauthausen - Áustria.
PARABENS PELA POSTAGEMMM MUITO BEM EXPLICADA
ResponderExcluirObrigada por usar minha foto na matéria e colocar créditos! Fiquei tão feliz com isso! Muito obrigada!
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