sexta-feira, 22 de agosto de 2014
terça-feira, 27 de maio de 2014
Literatura de Cordel na escola: sugestões metodológicas
Antônio Wanderley de Melo
Corrêa*
A escola é local por excelência onde a
dinâmica da sociedade se expressa, bem como suas permanências e tradições. A
comunidade está ali representada largamente, com estratos sociais diferentes,
faixas etárias e pessoas de níveis educacionais diversos e até com interesses
contraditórios. É um dos espaços das expressões genuínas da cultura popular, interagindo
com outras culturas, sendo um verdadeiro “laboratório” social e cultural
dinâmico.
A Literatura de Cordel, introduzida nas
atividades pedagógicas da escola, através de projetos específicos ou
interdisciplinares, gincanas, feiras culturais e oficinas de produção literária,
proporciona aos estudantes a oportunidade rica de um amplo diálogo com a
cultura popular, além do reconhecimento e afirmação desta cultura tradicional regional
em contraponto à cultura de massa ou de consumo.
Também estimula a prática da leitura, da
escrita neste mergulho na criatividade literária. É um exercício de
auto-afirmação e da valorização do próprio gênero Cordel, preservado e
expandido largamente e sem conta pelo Brasil a fora (ou seria adentro?). Nessa
linha de raciocínio, percebe-se que o Cordel na escola não é somente linguagem
e fonte de informação. Assim, se torna imprescindível o diálogo com a cultura
que emana deste gênero literário.
Quando o Cordel chega à escola, muitos
estudantes vêm como uma novidade exótica ou como uma realidade distante da
própria cultura escolar e comunitária. Entretanto, ao terem contato com os
conteúdos dos folhetos da poesia popular, sempre acontece uma grande
identificação, seja pela sua abrangência, seja pela enorme variedade temática,
contemplando todos os gostos, ou ainda pelo estilo bem humorado, irônico e lúdico
do gênero literário. Não obstante, o pedantismo e a descriminação de alguns “intelectuais”
o denominando de “paraliteratura” ou “literatura menor”. Coisa do Brasil, o império
das contradições. As expressões geniais e autênticas da nossa cultura são tratadas
com desdém por setores do mundo acadêmico, enquanto universidades européias, de
tradição milenar, reverenciam o Cordel brasileiro, através de disciplinas
específicas para estudar o gênero literário; produzem teses científicas e honram
poetas populares com títulos Honoris
Causa.
Assim, apresentar o Cordel à escola é
uma ação coerente com a história e a cultura regional, além de ser poderoso
aliado nas práticas de ensino/aprendizagem. É o que pretendemos mostra neste
escrito, baseado em duas excelentes obras sobre o tema: I - MARINHO, Ana
Cristina e PINHEIRO, Hélder. O Cordel no
cotidiano escolar. São Paulo: Cortez, 2012; II - HAURÉLIO, Marco.
Literatura de Cordel: do sertão à sala de
aula. São Paulo: Paulus, 2013.
Antes de tratarmos do tema, considero pertinente
ressaltar o que a leitura
proporciona: enriquece o vocabulário, aumenta a agilidade do pensamento, melhora
a verbalização e a dicção, favorece a fluência e a correção da escrita, amplia
e diversifica o conhecimento e expande as idéias e os valores, canalizando para
a ampla e verdadeira liberdade de pensamento.
Também são fundamentais alguns cuidados, no que se refere ao trabalho
educativo com qualquer gênero de leitura: sondar dos leitores o que gostam,
quais seus interesses, suas experiências culturais; partir de algo que possa
tocá-los; entender que o gosto pode ser educado; o prazer de ler não anula o
esforço da própria leitura e o trabalho de compreensão.
Destaquei seis ações metodológicas, como
sugestões para trabalhos educativos com Literatura de Cordel.
1.
A leitura oral – Ler em voz alta, com ritmo e entonação, é uma atividade
fundamental. Pode ser realizada mais de uma leitura. Trata-se de dar expressividade
à leitura. Poemas humorísticos ou dramáticos requerem tons e expressividades
adequadas. Assim, a leitura deverá ser sempre treinada antes da apresentação ao
público. É importante que a leitura seja feita com os folhetos, para que todos
conheçam esse tipo de produção cultural. De acordo com a temática de cada
poema, muitas atividades podem ser feitas com ou a partir dos folhetos. Para
aqueles estudantes que não têm o ímpeto para a leitura oral, é recomendável a
leitura individual e silenciosa, seguida do preenchimento de uma ficha de
leitura;
2. A variedade de temas – A Literatura
de Cordel possui uma variedade enorme de temas, que vai desde fatos históricos,
sociais e cotidianos até romances e fantasia. No Cordel, todos os assuntos e
informações viram versos. As idéias conflitantes e as ideologias diversas
contidas na poesia popular são estímulos ao debate, que deve sempre ser
privilegiado na sala de aula. Assim, os estudantes mergulham na cultura de seu
povo e são estimulados a serem agentes transformadores dessa cultura. A
discussão pode ser comparativa, sobre folhetos que tratem do mesmo tema, de um
tema da atualidade global ou regional, sobre os valores, acertos e possíveis
equívocos defendidos pelo autor;
3. Dramatizações – Desenvolver a
capacidade dos estudantes em reinventar as histórias dos folhetos de Cordel na
forma de dramatizações individuais ou grupais, sem a obrigação de cenários e
trajes elaborados, com sentido prático e explorando a improvisação. A Literatura
de Cordel já inspirou inúmeras peças do teatro brasileiro;
4. Cordéis cantados – Pode ter vivências agradáveis em sala de aula. Toda a turma ou
pequenos grupos podem cantar poemas de Cordel no estilo das cantorias de
violeiros (consulte vídeos na internet sobre esse gênero musical) ou os
próprios alunos criando músicas para as estrofes. Grandes nomes da música
popular brasileira cantaram poemas de Cordel;
5. Criações de histórias na sala de aula
– Na criação de histórias, as fontes de inspirações podem ser as experiências
pessoais, familiares ou comunitárias. Cada um pode colocar no papel, transpor
para um folheto, suas experiências em versos rimados: uma paixão, um sonho, um
problema social, uma luta comunitária, um fato histórico, um acontecimento
pitoresco, uma festa, uma partida de futebol, uma lenda da comunidade, entre
tantos outros motivos. Tudo pode virar versos;
6. Uma feira literária – Envolvendo diversas
atividades, como venda de folhetos, cantorias de violeiros, exposições de
folhetos, murais, palestras, oficina de produção de poemas e de confecção de
folhetos; encenações de histórias, apresentações de musicas influenciadas,
filmes inspirados, além de ilustrar as narrativas em cartazes.
Concluo
citanda a autora de um dos trabalhos que serviram de referência para este
escrito: O mais importante de tudo isto é
que a literatura de cordel seja percebida como uma produção cultural de grande
valor e precisa ser conhecida, preservada e cada vez mais integrada à
experiência de vida de nossas novas gerações (Ana Cristina Marinho).
(*) Licenciado em História pela UFS, professor das
redes públicas estadual (SEED) e municipal de Aracaju (SEMED/PMA), escritor de
livros didáticos sobre Sergipe e cordelista.
terça-feira, 13 de maio de 2014
Como Produzir Projetos Educativos
O Que é um Projeto?
Ò
É
um documento que contém o planejamento de um processo ou de uma atividade
pedagógica.
Ò
Diz
o que vai ser feito, porque, para quem, quando, para quê, com quais recursos e
como será avaliado.
Todo projeto
(educativo) é coletivo?
Ò
Sim,
porque a escola é um todo dinâmico dividido em várias partes;
Ò
Sim,
porque a interatividade é intensa e permanente;
Ò
Sim,
porque todos têm o direito e o dever da participação.
Passos de um Projeto
Educativo
Justificativa
Ò
É
o PORQUE fazer, a partir de uma avaliação coletiva (dos educadores) da
realidade da comunidade escolar;
Ò
É
a explicação de uma situação que deve ser transformada.
Objetivos
Ò
É
o PARA QUÊ. O aonde se quer chegar, a nova realidade que virá a existir
a partir das ações a serem desenvolvidas.
Metas
Ò
São
os objetivos QUANTIFICADOS. Exemplo: Alfabetizar 50 crianças (quantos)
em seis meses (quando);
Ò
Para
cada objetivo é importante existir a sua meta.
Público ou Participantes
Ò
Aqueles
a QUEM o projeto vai beneficiar, levando em conta a faixa etária,
escolaridade e o grupo social no qual eles estão inseridos.
Cronograma
Ò
É
o QUANDO pormenorizado em um calendário em formato de tabela, na qual
conste as atividades específicas (na
vertical) e os meses e suas respectivas semanas (na horizontal);
Ò
O
cronograma é fundamental para o monitoramento do projeto.
Recursos
Ò
É
o COM QUEM e COM QUE. Assim, eles são de três naturezas:
- Humanos – quem serão os responsáveis;
- Materiais – os equipamentos e materiais
de custeio necessários;
- Financeiros – o montante de dinheiro a
ser aplicado nas atividade (com tabela demonstrativa).
Metodologia
Ò
É
o COMO vai ser desenvolvido o trabalho;
Ò
É
o relato do trabalho, do início ao fim, definindo as etapas, as tarefas e os
responsáveis pelas mesmas;
Avaliação
Ò
COMO VAI ou FOI o trabalho; Momentos de
avaliação devem acontecer:
- Antes (para justificar);
- Durante (monitorando: o que vai bem e o
que vai mal);
- No final do processo (resultados
alcançados).
Bibliografia
Ò
A
relação das referências práticas e teóricas, bem como de indicativos oficiais
que foram consultados para a elaboração do projeto.
Responsáveis
Ò
A
lista dos nomes de todos os ENVOLVIDOS na execução do projeto:
- Corpo diretivo;
- Educadores (professores e pedagogos);
- Funcionários, estagiários e voluntários.
sexta-feira, 18 de abril de 2014
quarta-feira, 9 de abril de 2014
Leandro Gomes de Barros: o "Pai do Cordel"
Antônio Wanderley de Melo
Corrêa*
Ao
longo da história, a humanidade criou “pais” para as ciências, artes e
invenções tecnológicas. Assim, temos o pai da História (Heródoto), da Medicina
(Hipócrates), da aviação (Santos Dumont), do Rock brasileiro (Raul Seixas),
entre tantos outros. Em vários casos, esse título é disputado por mais de uma
personalidade.
O
cordel, gênero literário tão enraizado na cultura nordestina, também tem o seu
“pai”. Trata-se do paraibano de Pombal, Leandro Gomes de Barros, nascido em 19 de novembro de 1865 no sítio
Melancia.
No seu caso,
o título é praticamente inconteste, sendo ovacionado por outro grande poeta
popular, seu contemporâneo, João Martins Athayde como “o primeiro sem segundo”,
expressão consagrada até hoje entre os cordelistas, leitores e pesquisadores
daquele gênero literário. É considerado como o mais completo escritor brasileiro
da Literatura de Cordel, o maior poeta popular de todos os tempos, tendo
escrito aproximadamente 600 obras. É autor de vários clássicos e campeão
absoluto de vendas. Muitos dos seus títulos têm reedições ininterruptas até o
presente e ultrapassam a casa dos milhões de exemplares vendidos. Nenhum poeta
brasileiro vendeu e teve a sua obra propagada tanto quanto ele.
Na
adolescência, Leandro viveu na Vila de Teixeira/PB, onde conviveu com poetas
violeiros sertanejos, a exemplo de Ignácio da Catingueira, Romano da Mãe
d’Água, Silvino Pirauá, Bernardo Nogueira, Hugolino do Sabugi e Nicandro Nunes
da Costa. Pirauá, de Patos/PB, foi o primeiro a escrever romances em versos.
Leandro provavelmente
começou a escrever poemas em 1889, aos 24 anos. Mas somente em 1893 publicou
seus primeiros folhetos. Nesse período, os folhetos eram impressos em
tipografias de jornais no Recife/PE. Assim, o maior destaque foi formado pelo
quarteto Leandro, Pirauá, Francisco Chagas Batista e João Martins de Athayde.
Algum tempo depois, o segundo abandonou o Cordel para dedicar-se inteiramente
ao ofício de violeiro.
Na última
década do século 19, período fundamental do Cordel, foram estabelecidas as
regras de composição do gênero literário e formado o seu público fidelíssimo, o
povo camponês iletrado do sertão nordestino. O público do Cordel somente
começaria a diversificar-se nos anos 1960.
Depois de tornar-se
proprietário de uma pequena gráfica em 1906 ou 1907, a Typografia Perseverança,
os folhetos do “Pai do Cordel” se espalharam pelo Nordeste. Tornou-se assim, o primeiro
poeta editor do Brasil. Ao tempo no qual Recife começou a se tornar o centro de
propagação de folhetos da poesia popular. Leandro não somente imprimiu os
livretos de sua autoria, como também de outros poetas. Escrevia versos
diariamente, contratou distribuidores para vender malas de folhetos aos
“agentes”, que revendiam ao povo sertanejo e citadino em feiras, mercados,
portas de igreja e estações ferroviárias.
O
analfabetismo generalizado não era problema para que milhões de nordestinos
memorizassem os versos leandrinos e dos outros poetas do povo. Algum “letrado”
lia os poemas nos terreiros e alpendres das casas rústicas sertanejas para os
ouvidos atentos de mentes com memórias prodigiosas. Para os habitantes daquelas
vastidões, vivendo no isolamento da caatinga, o Cordel, além do lazer e do
despertar da fantasia, era o jornal, o meio de contato com o mundo “moderno”
distante. Para muitos, foi ainda a cartilha de alfabetização.
Leandro
não se limitou a escrever os temas em voga na sua época: gesta do gado,
cangaço, e lendas e romances relacionados à Europa medieval. Sua obra foi
magistralmente original e genuinamente brasileira, nordestina. Envolveu todos
os gêneros e modalidades de sua época: peleja, romance, gracejo, sátira e
crítica social. Escreveu poemas sobre assuntos cotidianos, verdadeiras reportagens
em versos; temas religiosos e políticos; sem esquecer os tradicionais como o
romanceiro, contos de fadas e de príncipes encantados e lendas européias. Quase
tudo ambientado na cultura sertaneja. Entre os temas prediletos, perpassava a
sua vasta obra, a mulher, a sogra e a cachaça. Escreveu no formato de estrofes
sextilhas, setilhas e décimas com versos de sete sílabas poética ou redondilha
maior.
Assim,
o “Mestre Leandro”, título atribuído a ele por muitos cordelistas das diversas
gerações, tornou-se o grande sistematizador da Literatura de Cordel do Brasil. Determinou
caminhos temáticos, estruturas das estrofes e estilos satíricos e críticos, que
são seguidos até a atualidade. O jovem cordelista e pesquisador deste gênero
literário, Marco Haurélio, afirma que Leandro “explorou e deu forma a todos os
gêneros e temas, preparando, assim, a estrada na qual os vates populares
transitam ainda hoje” [HAURÉLIO, Marco. Breve História da Literatura de Cordel.
São Paulo: Editora Claridade, 2010. P. 20].
Entre os
seus folhetos mais conhecidos, destacam-se: O Cavalo que Defecava Dinheiro,
História de Juvenal e o Dragão, História do Boi Misterioso, O Cachorro dos
Mortos, Batalha de Oliveiros com Ferrabrás, Branca de Neve e o Soldado
Guerreiro, A Confissão de Antônio Silvino, A Vida de Pedro Cem, A Peleja de
Leandro Gomes Contra uma Velha de Sergipe, A Força do Amor, Os Sofrimentos de
Alzira, Como Antônio Silvino Fez o Diabo Chocar, História de São João da Cruz,
Como se Amansa Uma Sogra, Vida e Testamento de Cancão de Fogo, O Casamento e o
Divorcio da Lagartixa, O Casamento do Sapo, As Proezas de um Namorado Mofino, A
Mulher Roubada, Suspiros de um Sertanejo, O Soldado Jogador, A Donzela Teodora,
entre muitos outros.
Como leitor
sergipano aficionado pelo Cordel, chamou-me muito a atenção o folheto “A Peleja
de Leandro Gomes com uma Velha de Sergipe”. O qual li com volúpia. Nos versos satíricos do poema, ele fala de
uma sua andança pelo nosso estado, provavelmente distribuindo folhetos de sua
tipografia. Assim, teria sido desafiado por uma velha na pensão de “um tal
Felipe”. De forma magistral, Leandro versou com muito humor a peleja com a
velha mal humorada. A disputa girou em torno de problemas de relacionamento e
de responsabilidade entre o homem e a mulher. Surpreendido com a grande
capacidade de embate verbal da velha, o vate paraibano confessou com extrema
ironia: A velha me fez subir/ Onde nem
urubu vai,/ Andei numa dependurada,/ Já estava cai ou não cai;/ Ainda chamei
tio a gato,/ Tratei cachorro por pai. A peleja foi tão feroz e renhida que,
ao final, o “Pai do Cordel” desabafou: Quando
foi no outro dia,/ Arrumei-me, fui embora,/ Com medo que a tal serpente/
Tornasse a vir cá fora./ Jurei de não voltar mais/ Onde o tal Diabo mora. E
assim teria se despedido para sempre da terra sergipana.
Nos folhetos
de sua autoria, publicados pela Editora Luzeiro, um dos parágrafos do “Resumo
Biográfico do Autor”, o descreve como “De espírito crítico, satírico e
contestador. Em seus versos avaliou os desmandos de seu tempo, principalmente
políticos, religiosos e referentes à interferência estrangeira no Nordeste”.
No livro
“Vaqueiros e Cantadores”, Câmara Cascudo o descreveu como: “Baixo, grosso, de
olhos claros, o bigodão espesso, cabeça redonda, meio corcovado, risonho
contador de anedotas, tendo a fala cantada e lenta do nortista, parecia mais um
fazendeiro que um poeta, pleno de alegria, de graça e de oportunidade”.
Suas obras-primas
inspiraram outros grandes autores, a exemplo de Ariano Suassuna, que utilizou a
história do cavalo que defecava dinheiro no seu "Auto da
Compadecida". Foi considerado pelo folclorista Luiz da Câmara Cascudo o
mais lido dos escritores populares. Para Carlos Drumond de Andrade, Leandro foi
"o rei da poesia do sertão e do Brasil".
Leandro foi
preso em 1918 porque o chefe de polícia considerou afronta às autoridades
alguns dos versos da obra "O Punhal e a Palmatória", trama que
tratava de um senhor de engenho assassinado por um homem em quem teria dado uma
surra. A estrofe mais famosa do poema é contundente: Nós temos cinco
governos/ O primeiro o federal/ O segundo o do Estado/Terceiro o municipal/ O
quarto a palmatória/ E o quinto o velho punhal.
O “pai” dos
poetas cordelistas faleceu em Recife em 4 de março de 1918, durante uma
epidemia de gripe espanhola ou influenza. João Martins de Athayde, também poeta
popular e futuro editor de seus títulos, no folheto “A Pranteada Morte de
Leandro Gomes de Barros”, sintetizou a grandeza de sua obra: Poeta como Leandro/ Inda no Brasil não
criou/ Por ser um dos escritores/ Que mais livros registrou/ Canções não se
sabe quantas/ Foram seiscentas e tantas/ As obras que publicou.
(*) Licenciado em História pela UFS, professor das
redes públicas estadual (SEED) e municipal de Aracaju (SEMED/PMA), escritor de
livros didáticos regionais e cordelista.
[ Artigo publicado no “Jornal
do Dia” em 08 abr. 2014. Pg. 04 ]
quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014
Breve histórico da literatura de cordel
Antônio Wanderley
O Cordel
é um gênero literário poético de origem popular, representando histórias
contadas em versos agrupados em estrofes, com rima e métrica (sete sílabas
poéticas), impressas em folhetos produzidos artesanalmente em papel barato ou
pela indústria gráfica, para serem lidos, contados ou cantados.
A
produção desses folhetos, em versos, retoma da Europa do século 16, durante o
movimento humanista ou renascentista, a partir da invenção da imprensa
(tipografias). Naquele tempo, o objetivo era resgatar e popularizar os relatos
orais ou manuscritos do cantar dos trovadores ou menestréis medievais.
As estrofes mais usadas eram as de seis
versos, as sextilhas, recitadas ou cantadas em forma cadenciada e melodiosa,
acompanhadas por violas. As temáticas, quase sempre, eram históricas, romances,
encantamento, narrativas e lendas.
Em
Portugal, nos séculos 18 e 19, havia o costume de os folhetos serem expostos à
venda, nas praças, feiras e mercados, pendurados em ‘cordéis’, termo de época
equivalente a cordão ou barbante da atualidade. As estampas das capas eram
impressas a partir de clichês metálicos contendo o título e a autoria da obra
e, às vezes, o nome do editor (proprietário da tipografia).
A partir de meados do século 19, essa
tradição aportou no Brasil. Os primeiros folhetos com versos rimados
(provavelmente manuscritos), com métrica de sete sílabas poéticas ou redondilha
maior, foram popularizados na Paraíba. Os primeiros poetas de destaque foram
Silvino Pirauá e Leandro Gomes de Barros, este último consagrado como o “Pai do
Cordel” e considerado “o primeiro sem segundo”. Esses e outros poetas sertanejos
migraram para Recife/PE com o objetivo de facilitar a impressão e a divulgação
de suas obras.
Do Nordeste, o Cordel espalhou-se pelo
Brasil, sendo levado para as outras regiões pelos migrantes.
Atualmente, os temas dos folhetos são
amplos: aspectos cotidianos, episódios históricos, temáticas nordestinas
(cangaço, seca, coronelismo, gesta do gado, Padre Cícero,...), biografias, lendas,
religiosidade, atualidades científicas e tecnológicas, fenômenos midiáticos,
vitórias esportivas ou eleitorais, aliados às temáticas tradicionais e
fantasiosas, que evocam romance, fantasia, encantamento, animismo, motes,
glosas, pelejas, personalidades regionais, entre outras.
Os
folhetos de Cordel são vendidos pelos folheteiros ou pelos próprios poetas
cordelistas, nas feiras livres e mercados. Também são vendidos em livrarias,
feiras de livros e instituições culturais.
Atualmente
a produção dos livretos conta com as possibilidades tecnológicas da indústria
gráfica, incluindo capas coloridas e formatos variados, não obstante, muitos
cordelistas preferirem produzir seus folhetos recorrendo à produção
“artesanal”: fotocópias de matrizes em papel A4 (para o miolo) e em papel ou
cartolina colorida para as capas, enquanto a diagramação é feita em programas
de edição de texto da informática.
Em
Sergipe, a Literatura de Cordel ganhou impulso com a chegada de um dos seus
maiores nomes a Aracaju, Manoel D’Almeida Filho, nos anos 1940. Durante quase
50 anos ele teve uma banca de venda de folhetos no Mercado Antônio Franco. Nos
anos 1950, João Firmino Cabral, aos 17 anos, tornou-se folheteiro do mestre
Manoel e também seu discípulo. Com a morte deste (1995), aquele se tornou a
maior referência do cordelismo sergipano, ambos fizeram escola, inspirando, incentivando
e arregimentando novas gerações de poetas populares.
Na
atualidade, as inovações temáticas, de diagramação, impressão e de
comercialização, publicações de obras na internet e o esforço de levar os
folhetos à escola são estratégias de sobrevivência e de propagação da Literatura
de Cordel.
[ Artigo publicado no Jornal
do Dia em 19 fev. 2014 ]
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